domingo, 3 de janeiro de 2016

Ao meu velho amigo que não me conhece agora

Eu gostava do jeito que era, de como costumava ser; mas você escolheu o jeito que é agora. Não sei como agir frente a isso, até porque eu ainda sou o antes. Não consegui te acompanhar e me desculpe, mas nem quero. As coisas mudaram.  Como naquela música do Arcade Fire que a gente gostava: '' Você cortou seu cabelo e eu nunca te vi de novo'', lembra? 
Agora quando você sorri pra mim, ri e me olha esperando alguma coisa, é diferente. Você passou a ser aquelas pessoas que achávamos maneiras antes; aquelas com quem você sai agora. Você se tornou um deles  e eu estou errada por me sentir desse jeito. E não importa o quanto possam ser uns idiotas às vezes, quem liga? Eu. Mas quem liga? Você está lá e eu estou aqui. ''Podiam ser estrelas distantes'', não é? Mas eu realmente ainda procuro você '' em cada carro que passa''. 
Eu te observei indo embora, só observei esperando alguma coisa, qualquer coisa, como você espera algo agora quando olha pra mim. E quando o pior aconteceu, mais de um vez, e eu decidi ir embora, você mal percebeu. E quando percebeu ''alguma coisa errada'', agiu como se não soubesse o porquê, como se não existisse um.  
Você tenta me seduzir com sorrisos esperançosos e nossas músicas favoritas mas eu só consigo te olhar decepcionada e triste. E cantar baixinho. Não era pra ser assim, era? 
Ainda escuto suas playlists do Spotfy e os cds que me deu de aniversário, admito, são muito bons. Mas o nó na garganta e o peso no peito sempre vem com as melodias. Porque eu sinto a sua falta, mas você não vai voltar; você não está mais aí. 
Estou cansada. Cansada demais pra tentar de novo. Repetir o mesmo processo. Nem fingir conseguir me parece muito fácil mais. E se talvez conseguisse e acontecesse de novo, porque você sabe no fundo que aconteceria, eu não sei o que eu faria. Talvez só me xingar mais uma vez e seguir em frente, dessa vez, com certeza absoluta de que as cartas estavam certas sobre você. E elas me avisaram, muitas vezes. 
Contudo, agora, em vez de chorar mais ainda, gritar e te xingar como tanto tenho vontade, vou apenas te agradecer por ter me ensinado que às vezes perdemos tempo com as pessoas erradas. E que às vezes as coisas realmente tem que dar errado pra você começar a entender. E te dizer, com pesar, ''Adeus, velho amigo'' e ''Olá, novo estranho''.


domingo, 27 de dezembro de 2015

Moral da história

Sinto sua falta como em uma fotografia antiga.
Se eu esticar bem o braço e fechar os olhos, posso alcançar aqueles sentimentos que um dia foram tão intensos que chegava a doer no fundo do peito, mas que agora permanecem enterrados como uma mera lembrança. Em minha mente, você cheira a nostalgia e o perfume que costumava grudar em minha camisa.
Sinto sua falta naquelas noites em que me sinto sozinho, mas depois me lembro de que, um dia, você foi a maior causa de minha solidão. E insegurança.
Com você aprendi que posso sentir raiva; raiva genuína, que pulsa e que rasga a garganta com gritos de frustração. Aprendi que posso sentir uma dor que me faz chorar até os olhos quase fecharem de tão inchados; dor que dilacera e queima, que se tivesse uma cor seria vermelha e que faz acreditar que nada vai ficar bem novamente. Entretanto, também aprendi que posso perdoar.
Com você, infelizmente, perdi minha ingenuidade, mas você foi apenas um termo nessa equação. Aconteceu com você antes, com outra pessoa. E provavelmente aconteceu com outra pessoa, dessa vez comigo, por minha causa. Ou então, vai acontecer. E vai ser um grande desastre com dor, raiva, lágrimas, olhos inchados... E perdão. E o sentimento de que estamos vivos. No fim desse grande ciclo vicioso em que alguém sempre acaba machucando outro alguém, as coisas, inacreditavelmente, terminam bem – apesar de antes parecer que não.

Com você, felizmente, eu aprendi a amar. E talvez um dia eu tenha pensado que foi azar que tenha sido com você. E talvez tenha horas em que eu sinta sua falta. Mas aprendi que às vezes sentimos falta de coisas que não precisamos. 


domingo, 20 de dezembro de 2015

Eu Sei


Não sou cega. Nem surda. Tampouco, muda. Mas finjamos que sim. 
Eu vejo. Percebo. Ouço bem e atentamente. Mas me calo. 
É seguro. Acredite. Me finjo de boba mas deixe assim. 
Eu sinto. Mas é diferente. Diferente de você. Diferente desses todos. 
Ah, todos. Que droga de todos. Que tormenta esses todos. Só calem a boca. Só não opinem. Silêncio. Por favor. Estou pensando. 
Eu peço, não toque. Não se aproxime, só vai piorar. Me deixe. 
Eu sei. Eu sei e isso me assombra. Pois de você eu sei. Só não sei de mim. 
Talvez eu seja a trapaceira, que só mente. Ou só alguém que não sabe o que está fazendo. 
Eu não sei. Eu não sei o que é isso ou o que será. Eu só sei que é assim agora. 
Desculpe se era segredo, mas eu sei. Desculpe. Eu sinto muito. 
E por saber é melhor eu ir agora, não é certo continuar. Mas eu também não quero ir. Eu só quero me acalmar. 
Eu não consigo. Você sim. 
Porque você tem toda a certeza que eu não consigo ter. 
E isso é tudo o que eu sei.
Eu sei como você se sente sobre isso. Só eu que não. Então deixa eu pensar. 
Deixa passar. Deixa correr. Deixa caminhar. Deixa se arrastar. 
Nesse exato momento, não vejo solução alguma. Está apenas um pensamento psicodélico e nauseante. 
Mas eu sei que isso vai passar. Então só deixa 



domingo, 13 de dezembro de 2015

Baú de memórias

Vejo meu pai rindo na cozinha com a minha mãe, brigando com o fogão e a comida. Era como ele sempre fazia, só que no fim sempre saía algo delicioso. Entretanto, sei que não é real. São como fantasmas, passando por mim, flutuando pela casa que, na realidade, está completamente vazia. Num piscar de olhos, eles somem.
Não sei o que é mais assustador: os fantasmas, ou o silêncio.
Queria poder manter a casa, porém é um tanto grande demais para a minha pequena família de uma pessoa e um coelho – sim, um coelho. Fred foi um impulso – mas uma boa companhia. Sem falar que não tenho dinheiro para isso, não mesmo. Meu irmão até tem – mais do que o suficiente para manter outras três iguais a esta – mas está ocupado demais sendo bem sucedido fora do país para se importar com uma casa velha.
Apenas não consigo imaginar outra família vivendo aqui. Seria como se estivessem destruindo meus sonhos; aqueles mesmos sonhos que rabisquei na parede acima da cabeceira da cama. Aqueles mesmos sonhos que provavelmente serão apagados com uma nova camada de tinta.
Aqueles mesmos sonhos que não fui capaz de realizar e agora parecem que vão ser deixados para trás de vez.
Eles provavelmente vão consertar a porta do banheiro que eu quebrei quando empurrei meu irmão contra ela no meio de uma briga. E também o degrau que range sempre que alguém sobe pro segundo andar.
Será que vão fazer uma horta no quintal? Aumentar a cozinha, que é minúscula? Minha mãe sempre teve essa vontade. Mas era como a porta: se falava sobre isso em um dia, e então, esquecia-se disso completamente no outro.
Ainda me lembro quando minha mãe começou a sentir contrações na poltrona da sala e, alguns dias depois, voltou a se sentar com meu irmão recém-nascido no colo. Agora, a poltrona nem está mais na sala.
Sei que memórias como essas serão apagadas algum dia e outras sendo construídas sobre elas só irão acelerar o processo. Talvez um dia eu passe por essa mesma rua e não consiga reconhecer a fachada da casa, pois passou por várias reformas. Talvez eu tenha medo de que, por causa disso, não consiga reconhecer a mim mesma. Estou perdida no mundo e tudo o que tenho são essas memórias... E a certeza de que sei quem sou. Não posso perder isso.

Quando estou finalmente indo embora, tiro uma última foto do que eu chamo de “baú de memórias da infância”. Sorrio ao ver que a luz do sol favoreceu a cor das paredes. A casa parece brilhar; parece mágica. Espero que essa foto seja o suficiente para manter as memórias bem vivas em minha mente.


domingo, 6 de dezembro de 2015

Saudade

Pensei no que me disse e estava certo, é mesmo difícil. Não só sentir, claro, mas traduzir. O que isso significa. 
Na internet só me dizem coisas como : nostalgia, melancolia, solidão, falta, música, ave, erva... 
saudade que é sentir falta de algo ou alguém. 
saudade que é o amor que permanece depois da perda. 
A saudade que é a melancolia por algo que já esteve lá mas não está mais. 
A saudade que é a melancolia por algo que nunca esteve realmente lá. 
A saudade que é a canção do marinheiro, que pode sentir falta de casa ou mesmo da casa que na verdade não existe; a saudade de ter algo do que realmente sentir saudade. 
A saudade que é um pássaro cujo macho é negro e a fêmea verde com barriga amarela. 
A saudade que é uma erva que pode chegar a 60 centímetros de comprimento e é também conhecida como : flor-de-viúva. 
Ou até mesmo, a saudade que a internet não comentou, a que não é de todo melancólica, preta, verde com barriga amarela ou cresce com um nome infeliz. A saudade que é mais feliz, se assim podemos dizer. A que você aceita sentir porque tem um bom significado; senti-la significa que o que houve vale a pena sentir saudade e senti-la significa que aquela pessoa que você sente a falta evoluiu, seguiu em frente e isso te deixa feliz, mesmo não deixando de doer. Esse significado ninguém me disse; ou melhor, você disse. 
Pode ter sido triste e maldoso de sua parte me lembrar que tudo vai mudar; que eu, eles e até você vamos mudar— crescer, talvez — e que mesmo que tentemos, não vai ser como antes. Mas ainda temos um pouco de tempo para seguir seu concelho e parar por um minuto para absorver esse instante, quando ainda está bom; estar plenamente consciente dele, para então poder deixa-lo ir. Deixar o ciclo continuar, o tempo passar, o infinito seguir seu rumo e a gente crescer. Porque é assim que funciona, não é, meu caro? 
A proposito, você estava certo e errado. Essa é sim uma das palavras de mais difícil tradução do mundo. Mas é a sétima, não a sexta como você havia dito. A sexta é alguma palavra em holandês que significa aconchegante. Fazer o que.