domingo, 2 de agosto de 2015

Meu falso amor de plástico

Eu não sabia o nome dela. Não sabia onde ou o quê ela estudava. Não sabia o que ela fazia em seu tempo livre ou que músicas ela gostava de ouvir. Tudo o que eu sabia é que ela pegava o mesmo ônibus que eu. Na verdade, quem fazia questão de pegar o mesmo ônibus que ela todos os dias era eu. Ela não era exatamente o tipo de garota que chama a atenção de todos por onde passa. Pelo contrário, ela estava distante do limitado ideal de beleza que nós veneramos. Ela estava acima do peso e tinha uma pele muito, muito pálida. Tão pálida que as nuvens já não eram mais brancas aos meus olhos. Seus cabelos eram longos, ondulados e escuros. Ela sempre usava o mesmo esmalte de cor... É, eu não sei que cor era aquela. Mas combinava com seus olhos castanhos e com seus lábios convidativos. Estava sempre com uma expressão séria e concentrada enquanto lia seus romances policiais. Eu queria descobrir o que se passava na cabeça dela e acabei descobrindo que ela era o que estava se passando na minha.

Não estava planejando ou sequer cogitando fazer isso, mas por um momento a vontade de ouvir a voz dela superou toda e qualquer objeção que eu pudesse sustentar. A minha coragem depende unicamente de não ponderar sobre uma situação, então eu não ponderei. Desci do ônibus atrás dela sem pensar duas vezes ou olhar pra trás. Eu a segui de longe até uma estação de metrô. Ela parecia estar esperando por alguém. A essa altura andar até lá seria a menor das minhas dificuldades. Mas que palavras deveriam sair da minha boca quando nossos olhares se cruzassem? Não tive muito tempo pra me questionar quanto a isso. Um cara, que aparentava ser um pouco mais velho que nós dois, aproximou-se dela, a segurou pela cintura e a beijou intensamente por alguns segundos.


Aquele foi o primeiro e único sorriso que eu vi em seu rosto. Estava na hora de experimentar novas linhas de ônibus e eu não tinha o direito de ficar triste com isso. Porque ela estava bem e tinha alguém com quem podia contar. Alguém que despertava nela sorrisos como aquele. Há dias em que não compensa acordar, sair de casa ou dar ouvido aos próprios pensamentos. As pessoas ao meu redor vivem dizendo que somos nós que fazemos o nosso destino, então eu decidi que naquele dia eu voltaria pra casa com os meus próprios passos.


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